
A Rua
Nicodemos Rocha, 61 anos, nasceu em Lins (SP), casou-se, teve filhos, mas um dia resolveu deixar a família e ganhou as ruas da capital paulista. Na cidade grande, seu Nico, como é conhecido, trabalhou durante 30 anos como carpinteiro. O dinheiro gastou com mulheres, drogas e bebidas. Aos poucos, viu a idade chegar e as forças irem embora.
As ruas do bairro de Santana foram deixadas para trás, os amigos também. Seu Nicodemos foi morar em albergues. Um assistente social do Boracéia o encaminhou para tratamento porque era preciso ficar longe do álcool. Depois foi para o Hotel Social Franciscano. Para quem está longe de casa, ou para quem não tem casa, o que resta é a rua ou perambular de albergue em albergue, sem rumo, sem destino, sem amanhã.
A terceira idade
Sônia de Campos casou-se em 1954, aos 16 anos de idade, teve quatro filhos e cinco netos e hoje, aos 74 anos vive em um espaço de convivência para idosos, por falta de dinheiro para as despesas da casa. Dona Sônia fala bem, é articulada, senhora educada. Conta que teve uma infância tranquila ao lado da mãe. Casou-se cedo e foi feliz no casamento, mas as noras não a querem por perto. O custo de vida na cidade é alto, o salário-mínimo de aposentadoria não é suficiente para pagar as despesas.
Por isso, há sete meses, procurou o Espaço Aberto de Convivência para morar. “Aqui tenho amigos, encontrei carinho, não me sinto sozinha”, afirma dona Sônia. Este espaço tem 60 vagas para idosos, 56 estão preenchidas e sete ocupadas por mulheres. Segundo Cecília Apostolopoulos, coordenadora, a organização social aposta no carinho e no respeito, nas pequenas coisas do dia-a-dia, como, por exemplo, chamá-los pelos nomes. Pequenos detalhes que fazem com que eles se sintam novamente pessoas, olhem o mundo com outros olhos.
A rádio
Em janeiro deste ano, por ocasião do aniversário de São Paulo, a Rádio Tupi FM 104,1 fez a promoção “104 ouvintes em Aparecida do Norte”. Seu Nicodemos pediu para ao educador Valter que o cadastrasse na promoção. Nas ondas do destino, seu Nicodemos foi sorteado. Dona Sônia, que estava perto disse que tinha vontade de conhecer Aparecida do Norte. Bem, imaginem quem acompanhou seu Nico na viagem?
O amor

A viagem juntos a Aparecida do Norte despertou uma amizade profunda entre os dois, tão profunda a ponto de decidirem morar juntos. No dia 5 de fevereiro de 2011, o Espaço Aberto fez uma festa para comemorar a decisão de dona Sônia e seu Nicomedes.
A noiva teve direito a vestido com véu e grinalda, e os noivos, bolo, champanhe e flores. Os conviventes compraram muitos presentes. Valter, o educador, caprichou na música, tocou violão como nunca. Dona Sônia, aos 74 anos de idade, bela e feminina, foi maquiada com carinho e esmero pelas moças que cuidam da casa no dia a dia. Foi visível o nervosismo de seu Nico. Há décadas ele não sabe o que é ter uma família, um lar só seu.
Após o casamento, partiram para Aguaí, cidade em que alugaram uma casa. Estão animados e vão dividir as despesas.
“Quero cuidar dele e que ele cuide mim, juntos vamos ter uma vida feliz”, disse dona Sônia. Para seu Nicodemos, a terceira idade foi o momento de encontro com a felicidade trazida pela maturidade.
Edição N° 198 - Junho de 2011
Comments