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  • Catadores lutam pela efetividade da lei

    A geração de lixo sempre foi um grande problema para as cidades. Anos e anos os catadores de materiais recicláveis e moradores em situação de rua realizaram um serviço ambiental de limpeza pública e proteção do meio ambiente. O Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) elegeu entre seus objetivos prioritários a construção de políticas públicas para o tratamento adequado do lixo com inclusão social dos catadores. Durante muitos anos, provocou a sociedade e o poder público para a necessidade de um marco regulatório para a produção e destinação final de resíduos sólidos no Brasil. Antes mesmo de se ouvir falar em aquecimento global e mudanças climáticas, os catadores buscavam imprimir nessa nova lei um caráter social que atendesse às ansiedades dos trabalhadores que, desde sempre, fizeram a destinação correta dos resíduos sólidos, gratuitamente, em condições precárias e, em muitas situações, sendo marginalizados pelo poder público. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), aprovada pelo legislativo e regulamentada pelo Governo Federal (Lei 12.305 de 2 de agosto de 2010) é fruto de uma luta que durou 21 anos. Depois de muita briga e reivindicação, a Lei prevê incentivo às organizações de catadores, assim como a participação delas na gestão integrada dos resíduos sólidos e na cadeia produtiva. Segundo Roberto Laureano, catador da Coordenação Nacional do MNCR, a nova legislação traz para os catadores muitos desafios, “temos os planos de resíduos sólidos que os municípios têm que elaborar, por isso estamos articulando para que todas as organizações discutam esses planos em seus municípios para garantir, de fato, a participação dos catadores no processo”, explica. “Temos que fazer valer aquilo que está na lei, é importante que os municípios entendam que é preciso reduzir, reutilizar e reciclar, para em último caso pensar em processos de reciclagem energética”, esclarece Laureano, informando também que a recuperação energética não é apenas a incineração, mas há outras alternativas de recuperação que não a queima dos recicláveis. Para Laureano, “os municípios estão pulando etapas e o movimento está buscando apoio jurídico para travar esses municípios que estão tentando implantar incineradores e excluir os catadores do processo. Estamos nos unindo a outros movimentos sociais para fazer barulho, para dizer não à incineração”, completa. O andamento da PNRS sempre foi bloqueado pelo interesse das indústrias que preferiam não se responsabilizar por seus resíduos. São, na realidade, resíduos perigosos que afetam à saúde humana e à natureza de forma irreversível. A indústria tem uma dívida histórica com os catadores e deve pagar o trabalho realizado pelas cooperativas para recuperação de suas embalagens pós-consumo. É preocupação do MNCR que se garanta a presença, também, dos catadores nas políticas públicas de gestão de resíduos sólidos no Brasil. “Nossa luta é para que estejamos juntos, presentes nesse processo. Não queremos que as indústrias nos vejam apenas como forma de ajuda ou assistência, queremos de fato sermos vistos como um braço de trabalho nesse processo e que esse trabalho tem que ser remunerado”, declara Laureano. Íntegra da lei no site do MNCR: www.mncr.org.br/box_2/instrumentos-juridicos/leis-edecretos-federais Edição N° 196 - Abril de 2011

  • Um recomeço em sua vida

    Pedro Silvério da Silva tem 52 anos e nasceu no Sítio Colombina, na Boca da Mata em Alagoas. Veio para São Paulo com cinco anos de idade. Quando criança foi coroinha na Igreja Santa Rita de Cássia dirigida pelo padre Maciel e tem boas lembranças dessa época. Na juventude, iniciou um período em que roubava motéis, fábricas, mercados, mas não gostava de roubar dos pobres. Por causa disso, ficou preso no Carandiru, em 1979, quando tinha 20 anos. Como vivia-se, ainda, período da Ditadura Militar, Pedro conheceu a “pendura”, um instrumento de tortura utilizado para que os prisioneiros entregassem seus parceiros. Pedro nunca entregou ninguém, pois sabia que os delatores morreriam na prisão. Durante todo o período em que esteve preso contou com visitas e apoio da família, especialmente de sua mãe. No início ficou muito revoltado com o que aconteceu, não rezava, não tinha fé e nem esperança. Após muitas mudanças de presídio e experiências difíceis, começou a mudar sua postura, avançou na escolaridade, fez cursos como pintura de paredes, marcenaria, dentre outros, e trabalhou nas tarefas de faxina do presídio. Além disso, passou a fazer poesia e buscou aproximar-se da religião. Uma importante lembrança do presídio é a de um quadro que comprou de outro detento por cinco maços de cigarros. “Um rapaz chamado Nenê fez uma obra de arte e eu a coloquei em minha cela. Sentia que o significado da obra era de grande valor, mas sua fama era de que estava preso”. Pedro saiu da cadeia há quatro anos e “graças a Deus e com uma promessa muito grande que fiz para Nossa Senhora, de fazer um manto do tamanho dela. E prometi à minha mãe que nunca mais voltaria ao crime. É uma forma de agradar a mim mesmo e à minha família”, comentou. O problema principal que Pedro enfrenta é que após esses anos em liberdade ainda não conseguiu ajeitar sua vida. Como não consegue trabalho e não quer voltar para a casa da mãe, a saída tem sido morar nas ruas ou em albergues. Pedro observou que não consegue se adaptar as regras rígidas dos albergues, onde as pessoas são tratadas como crianças, mas morar na rua também não tem sido fácil. De inicio, viveu em malocas, mas apanhou e concluiu que não dá para ter amigos nessas condições. Pedro frequenta o Refeitório Comunitário do Povo da Rua (Rua Penaforte Mendes, 56), mas sai durante o dia para ganhar algum dinheiro na jardinagem, varreção das ruas, ou levar sacolas pesadas próximo ao Mercado Municipal no Parque Dom Pedro. “Isso já é alguma coisa. Com as pessoas paradas não vai acontecer nada mesmo”. Por mais dificuldades que esteja passando, Pedro considera que aprendeu muita coisa com tudo que viveu. Para Pedro, Deus dá o livre arbítrio aos homens. “As vezes, a gente desvia do caminho que Ele nos colocou, mas esse desvio é a gente que faz”. Toda religião “tem sua forma, mas todas falam dos ensinamentos de Deus e ensinar os caminhos para chegar até Ele, é o mais difícil. E o caminho para chegar a Deus é ter consciência de que ele é o amor. Ele só quer alguém ao lado dele se praticar o bem e quer todos como irmãos e como parceiros do dia a dia”. Pedro entende que as pessoas ficam em situação de rua por várias razões: “drogas, pinga, desquilíbrio familiar, saída de presídio e, também, por falta de trabalho, mas todos na rua têm a possibilidade de encontrar um caminho”. Pedro está muito feliz, atualmente, com uma oportunidade inesperada de trabalhar como vendedor da revista OCAS´ e considera que este trabalho será muito importante na sua busca de um caminho.   Edição N° 197 - Maio de 2011

  • “Dia de Luta”

    “Entidades que trabalham com moradores de rua preparam para esta quarta-feira, mais um Dia de Luta do Povo da Rua. Uma comissão de dez pessoas representando os moradores de rua e as entidades negocia com o prefeito a implantação da Lei nº12.316/97, Lei do Povo da Rua”. ( O Trecheiro , Ano VIII, nº 54, maio, 1998, pg. 1). No início dos anos de 1990, verifica-se em São Paulo um olhar e atenção diferenciados em relação às pessoas em situação de rua. É o governo democrático-popular na gestão de Luiza Erundina que propiciou, nessa área, a realização de estudos e implantação de serviços. O diálogo e discussão das necessidades e possibilidades de trabalho com a população de rua com a sociedade civil abriram o horizonte do poder público municipal, que em parceria com organizações sociais inovaram ações. Nesse contexto, organizações sociais reuniram-se, no Brás, e criaram o Dia de Luta. Nessa preparação, estavam presentes, representantes das casas de convivência do Brás, Penha, Porto Seguro, o Centro Comunitário São Martinho de Lima, a Coopamare e o Centro de Documentação, hoje, Rede Rua. Assim, no dia 10 de maio de 1991, com o tema “A miséria fala por si mesma”, aproximadamente, 1.000 pessoas caminharam do Brás em direção à Câmara Municipal, onde foram recebidos pela prefeita Luiza Erundina nesse 1º Dia de Luta do Povo da Rua. Nunca pessoas em situação de rua tinham entrado neste local e recebidos por autoridades municipais. ( O Trecheiro , Ano IX, nº 77, junho, 2000, pg. 4). Nessa primeira plenária, pessoas em situação de rua e organizações sociais definiram a luta por políticas públicas e persistiram nessa trajetória de defesa de direitos sociais e de ações nas áreas da habitação, saúde, assistência social e educação, prioritariamente. As diversas mobilizações propiciaram conquistas, dentre elas a Lei nº12.316/97 e o Programa “A Gente na Rua” com a criação dos agentes comunitários de saúde da rua, reivindicação do Dia de Luta do Povo da Rua de 2003. Além disso, esses atos de caráter político deram visibilidade à sociedade, das mortes e violência cotidiana nas ruas, das duras condições de vida, mas também consciência da importância da organização popular para quem deles participaram. Em 2010, o Movimento Nacional da População de Rua decidiu que o “Dia Nacional de Luta do Povo da Rua” será sempre realizado no dia 19 de agosto, data do massacre de 2004 em São Paulo. Para conhecer mais sobre temas, datas e reivindicações dos dias de luta ver O Trecheiro , Ano VIII, nº 165, maio, 2008, pgs. 2 e 3.   Edição N° 107 - Maio de 2011

  • Empresas atrasam e catadores continuam nas ruas

    Os catadores de materiais recicláveis da cidade de São Paulo continuam na luta pela ampliação do programa de coleta seletiva municipal. No dia 4 de maio, participaram de audiência pública promovida pela Comissão de Política Urbana da Câmara Municipal para cobrar a construção de novos galpões e inclusão de mais catadores no programa. A catadora Luzia Honorato, representante do Comitê de Catadores, esteve presente e reivindicou maior agilidade na construção dos galpões previstos no contrato de prestação de serviços das concessionárias. Estas têm que construir 17 novas centrais de triagem em um prazo estabelecido de quatro anos. Os representantes das empresas declararam aos presentes que como o contrato foi modificado pela Prefeitura a exigência para construir os galpões foi postergada. “Dinheiro para construir nós temos, mas o contrato não prevê que isso tenha que ser feito agora”, declarou Luiz Gonzaga, representante da Logística Ambiental de São Paulo (Loga), uma das duas concessionárias responsáveis pela coleta do lixo no município de São Paulo. Segundo foi informado na audiência, as concessionárias são obrigadas a construir os novos galpões apenas a partir de 2012. A Loga, por contrato, tem que construir cinco novos galpões até 2014. Já a Ecourbis, outra concessionária que recolhe o lixo da cidade deve construir 12 novos galpões, mas seu prazo é até 2014. “Sinceramente, saí de lá decepcionada. A audiência não deu em nada. A opção que temos agora é reativar o Conselho Gestor do programa de coleta seletiva para pressionar por providências do Executivo”, avaliou Luzia. “Denunciamos a falta de comprometimento da Limpurb, pois existem recursos federais e do crédito de carbono para a construção de mais galpões, mas que estão parados desde 2007”, completa. Os catadores denunciam também a grande burocratização para incluir mais cooperativas no programa de coleta seletiva. Edição N° 107 - Maio de 2011

  • A rua, a terceira idade, a rádio e o amor

    A Rua Nicodemos Rocha, 61 anos, nasceu em Lins (SP), casou-se, teve filhos, mas um dia resolveu deixar a família e ganhou as ruas da capital paulista. Na cidade grande, seu Nico, como é conhecido, trabalhou durante 30 anos como carpinteiro. O dinheiro gastou com mulheres, drogas e bebidas. Aos poucos, viu a idade chegar e as forças irem embora. As ruas do bairro de Santana foram deixadas para trás, os amigos também. Seu Nicodemos foi morar em albergues. Um assistente social do Boracéia o encaminhou para tratamento porque era preciso ficar longe do álcool. Depois foi para o Hotel Social Franciscano. Para quem está longe de casa, ou para quem não tem casa, o que resta é a rua ou perambular de albergue em albergue, sem rumo, sem destino, sem amanhã.   A terceira idade Sônia de Campos casou-se em 1954, aos 16 anos de idade, teve quatro filhos e cinco netos e hoje, aos 74 anos vive em um espaço de convivência para idosos, por falta de dinheiro para as despesas da casa. Dona Sônia fala bem, é articulada, senhora educada. Conta que teve uma infância tranquila ao lado da mãe. Casou-se cedo e foi feliz no casamento, mas as noras não a querem por perto. O custo de vida na cidade é alto, o salário-mínimo de aposentadoria não é suficiente para pagar as despesas. Por isso, há sete meses, procurou o Espaço Aberto de Convivência para morar. “Aqui tenho amigos, encontrei carinho, não me sinto sozinha”, afirma dona Sônia. Este espaço tem 60 vagas para idosos, 56 estão preenchidas e sete ocupadas por mulheres. Segundo Cecília Apostolopoulos, coordenadora, a organização social aposta no carinho e no respeito, nas pequenas coisas do dia-a-dia, como, por exemplo, chamá-los pelos nomes. Pequenos detalhes que fazem com que eles se sintam novamente pessoas, olhem o mundo com outros olhos.   A rádio Em janeiro deste ano, por ocasião do aniversário de São Paulo, a Rádio Tupi FM 104,1 fez a promoção “104 ouvintes em Aparecida do Norte”. Seu Nicodemos pediu para ao educador Valter que o cadastrasse na promoção. Nas ondas do destino, seu Nicodemos foi sorteado. Dona Sônia, que estava perto disse que tinha vontade de conhecer Aparecida do Norte. Bem, imaginem quem acompanhou seu Nico na viagem?   O amor A viagem juntos a Aparecida do Norte despertou uma amizade profunda entre os dois, tão profunda a ponto de decidirem morar juntos. No dia 5 de fevereiro de 2011, o Espaço Aberto fez uma festa para comemorar a decisão de dona Sônia e seu Nicomedes. A noiva teve direito a vestido com véu e grinalda, e os noivos, bolo, champanhe e flores. Os conviventes compraram muitos presentes. Valter, o educador, caprichou na música, tocou violão como nunca. Dona Sônia, aos 74 anos de idade, bela e feminina, foi maquiada com carinho e esmero pelas moças que cuidam da casa no dia a dia. Foi visível o nervosismo de seu Nico. Há décadas ele não sabe o que é ter uma família, um lar só seu. Após o casamento, partiram para Aguaí, cidade em que alugaram uma casa. Estão animados e vão dividir as despesas. “Quero cuidar dele e que ele cuide mim, juntos vamos ter uma vida feliz”, disse dona Sônia. Para seu Nicodemos, a terceira idade foi o momento de encontro com a felicidade trazida pela maturidade. Edição N° 198 - Junho de 2011

  • Cadeiões “abrigam” moradores de rua

    Nos anos recentes, temos notado uma progressiva alteração no perfil da população prisional nos centros de detenção provisória da Capital. Aos já acusados de crimes com violência, foi adicionada uma parcela da população sem histórico de violência e com saúde bastante debilitada vinda, principalmente, do centro de São Paulo. Em 2010, o levantamento apontou pessoas em situação de rua com prática de pequenos furtos ou em virtude do porte de entorpecentes, especialmente crack sem o uso de armas. A maioria alega ter sofrido agressão durante a abordagem policial, particularmente, por parte da Guarda Civil Metropolitana. Solução fácil e barata para superar o déficit habitacional, os centros de detenção provisória (CDPs) são os antigos cadeiões da Segurança Pública, com capacidade para apenas 520 presos, mas abrigam até 1.700. Essa parece ser, sem dúvida, a forma escolhida pelo governo paulista para gerir questões ligadas à população de rua, ou seja, de forma autoritária e agressiva, segregando-a da população em geral e, assim, mantê-la distante dos olhos do público. Com efeito, perda da liberdade e criminalização do povo de rua têm sido o caminho encontrado pelo governo paulista para retirar do Centro as minorias, consideradas, indesejáveis. A população de rua que outrora foi vista como expressão do descaso e da falta de compromisso do Estado, hoje, é representada como inimiga pública, como grupo que oferece risco para a sociedade, como perturbadora da ordem e da paz social. Por isso, demanda ser reprimida e deslocada para um local distante e invisível aos nossos olhos. Nos últimos anos, a população prisional tem alterado o seu perfil. Em 2005, o furto representava menos de 10%, em 2010, subiu para quase 20%. O caso do tráfico é mais grave, pois passou de 10%, em 2005, para 25% em 2010. (Fonte: Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça (Depen). Em outras palavras, a preferência da Justiça Criminal hoje está voltada para dependentes químicos que praticam pequenos furtos e roubos para alimentar sua dependência. São pessoas não violentas, com estado de saúde debilitado, sem habitação, sem escola e sem emprego, para a qual o governo deveria investir, mas preferiu etiquetá-la como criminosa e escondêla da sociedade nas unidades prisionais imundas de Pinheiros. Hoje são as “minorias indesejadas” os destinatários das políticas repressivas do governo estadual, amanhã serão todos aqueles que, de alguma forma, representem risco ao bom funcionamento do sistema. Urge reverter esse quadro!   Edição N° 198 - Junho de 2011

  • Glicério: território de resistência dos catadores

    Pesquisa realizada pela arquiteta Márcia Hirata aponta a região do Glicério como território de resistência do catador de material reciclável. O estudo foi defendido como tese de doutorado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, sob orientação do sociólogo Paulo Cesar Xavier Pereira. A pesquisa baseou-se no método de história oral abrangendo catadores organizados na Cooperglicério, fundada em 2006 na baixada do Glicério. O Glicério sempre foi uma região rica em debates sobre a população em situação de rua e dos catadores. “À medida que fui conhecendo o local, desde 1997, tomando conhecimento da quantidade de entidades que desenvolvem seus trabalhos ali, fui percebendo que tal convergência não se tratava apenas de uma coincidência. A partir desta percepção fui instigada a entender o que significa esta mobilização em torno da região”, explica. O estudo se desenvolveu baseado no interesse da pesquisadora de entender como as pessoas de baixa renda constroem suas vidas, seu trabalho, em meio ao conflito, à disputa por espaço e à ameaça de expulsão, uma realidade do centro da cidade imposta pela valorização imobiliária. “O trabalho começa na década de 1980, momento de bastante mobilização dos movimentos urbanos, que se reflete no Glicério. Minha estratégia foi amarrar a história da construção da Cooperglicério com a história pessoal das pessoas. Assim fui entendendo como o Glicério foi se constituindo como um espaço dos catadores”. De acordo com a arquiteta, ao longo da história, construiu- se uma rede social no Glicério, composta por entidades, pastorais, apoiadores e universidades, em torno do trabalho do catador. “O Glicério oferece possibilidades para a reciclagem que garante a permanência deles ali. O trabalho destas pessoas foi construindo e aglutinando uma rede social, sobretudo a partir do final dos anos 1970, quando houve a oportunidade, com a ajuda de apoiadores, de um fazer mais politizado em relação ao trabalho. Este é um fator decisivo para a permanência do catador na região”. Do ponto de vista urbano, define Márcia, a condição colocada no Glicério permite perceber o catador por um viés que ultrapassa a condição de trabalhador superexplorado pelo capital. “Ele está em uma cadeia produtiva do capitalismo, e por isso está na condição de explorado, mas é também um sujeito político do ponto de vista urbano. Ele organiza, por meio de decisões coletivas, o seu trabalho, luta por reconhecimento, por leis e conquistas institucionais”, afirma.   Território do catador A pesquisadora recorre ao processo histórico para avaliar como o Glicério foi se constituindo como espaço dos catadores. Logo no início da formação de São Paulo, a centralidade estava no Pátio do Colégio, voltada para o rio Tamanduateí (Avenida do Estado). Na década de 1910, o setor imobiliário começou a ter interesse pelo outro lado da cidade, a região oeste. “O Glicério passou a ser as costas da cidade. Isso significa dizer que a região não despertava interesse nos investimentos imobiliários, espaço de uso das elites e acabou se tornando espaço de possibilidade para as pessoas que não possuíam acesso à cidade formal”. Pela concentração de pobreza, explica Márcia, a região passou a atrair a atenção e os esforços das pastorais e de entidades, como a Organização de Auxílio Fraterno (OAF). Na década de 1980, com a efervescência dos movimentos sociais, havia debates e luta por direitos, principalmente, na periferia da cidade, que não poderia deixar de incluir o Glicério. “Ali sempre houve entidade assistencial. Mas no final de 1970, iniciou-se um processo de reflexão sobre as causas desta pobreza, cujo método de trabalho era provocar o debate junto às próprias pessoas que estavam passando pela situação de pobreza”, explica. Um dos atores que apareceram como potenciais superadores da pobreza foram os catadores. “Tinham uma renda e passaram a fazer um debate da superação da pobreza por meio de seu próprio trabalho, afinal eram superexplorados”. Na época era comum a dependência do catador em relação ao dono do ferro-velho. “Eles moravam nos depósitos em troca de vender o que catassem para o dono do ferro-velho. A construção do fazer politizado e sua consolidação foi fator fundamental para que a própria condição do trabalho do catador se modificasse. Hoje a quantidade de catadores que se submete ao dono de um ferro-velho no Glicério é bem menor”. Leia mais: www.rederua.org.br    Edição N° 198 - Junho de 2011

  • Consultórios de Rua e Redução de Danos

    Estar na rua, conviver, conversar, fazer um curativo, propor encaminhamentos pontuais, e ter escuta atenta são alguns dos objetivos do Consultório de Rua. Uma equipe profissional multidisciplinar formada por médicos, psicólogos, assistentes sociais, pedagogos, educadores sociais, além de veículos, preservativos, cartilhas instruções e material para curativos, medicamentos de uso mais frequente em tais situações. O Consultório de Rua é uma parceria do município de Guarulhos (SP) com o Ministério da Saúde. Ao aproximar-se, a equipe se esforça para criar um clima amigável. Alguns sentam no chão, improvisam banquinho, propõem atividades lúdicas e iniciam o trabalho individual ou em grupos. Para Orlando Mesquita da Silva, morador de “calçada”, “o pessoal do consultório é legal tem uma atenção e quer ajudá-los”. Segundo Cléia Martins Januário, coordenadora do Consultório de Rua, o principal objetivo é trabalhar com a redução de danos em álcool e em outras drogas. Para Sebastião Firmino do Nascimento Filho, 25 anos, com ensino médio concluído, egresso do sistema penitenciário e há três anos vive em situação de rua, afirma que tem conseguido melhorar com a ajuda dos profissionais. “Eles entram em foco para não deixar agravar a doença dos moradores de rua e eles tentam tirar a gente da rua, mas o albergue é pior do que a rua”, afirma Firmino. Para a assistente social, Helena Luiza de Sá Almeida, do Consultório de Rua, o desafio está em todo o processo. “A conquista da confiança, a criação de vínculos, o levantamento das necessidades deles e a dificuldade de convencê-los a começar o tratamento ou a ir para um equipamento é o nosso dia a dia”, afirmou Helena. Ainda, segundo ela, as demandas são pela obtenção de documentos. “Após a documentação, passamos para outros encaminhamentos, pois tudo precisa de documentos” conclui Helena. Para a dra. Julie Mustafa, a tentativa é diminuir a vulnerabilidade que as doenças próprias da rua podem estar agravando a vida das pessoas em situação de rua. “Em casos mais graves, levamos ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e depois fazemos o encaminhamento para especialistas e acompanhamos”, afirma Julie. O diferencial e o avanço do Consultório de Rua de Guarulhos estão na gestão compartilhada entre as secretarias municipais da Saúde e da Assistência Social. Mesmo assim, a equipe ainda sente falta de um espaço de acolhida. “Algumas pessoas já têm uma cultura de rua, já não aceitam a instituição como o trabalho, a família e até o albergue. Por isto, o espaço intermediário poderia ajudar a fazer essa passagem.   Edição N° 196 - Abril de 2011

  • Terremoto, tsunami e vazamento nuclear

    Parte I - Os refugiados econômicos de Nagoya, Japão O terremoto de 11 de março no Japão, seguido de tsunami e vazamento nuclear colocaram o Japão em evidência na imprensa mundial. Vivi os efeitos dos abalos sísmicos no centro da cidade Nagoya (700 km do epicentro). Naquela tarde, eu andava pelas ruas da cidade e me contagiava pelo verde e amarelo das bandeiras que encontrava pelo caminho quando tive uma sensação de vertigem durante trinta segundos. Procurei um local onde pudesse me apoiar e “esperar que a tonteira passasse”. Após alguns minutos entrei em uma das lojas de produtos eletrônicos. Ao assistir o canal de TV que transmitia a tragédia ao vivo pude compreender o que acontecera comigo. Viver em uma ilha cercada de água por todos os lados; correr riscos de ocupação por inimigos; estar ameaçada por catástrofes naturais; ter vivido a tragédia como Hiroshima e Nagasaki são fatores que fi zeram com que o Japão se tornasse a segunda economia mundial. “O povo japonês é como águia. Quando pensa estar sem asas para alçar vôo, consegue realizar um vôo mais alto ainda. Por ser disciplinado e organizado consegue superar diferentes situações”, explica Anselmo de Melo, missionário brasileiro há sete anos no país.   O projeto Como país desenvolvido, o Japão, no entanto, não consegue esconder a contradição intrínseca do sistema capitalista, a exclusão de grande parte da população das benesses do mercado. Nagoya, uma cidade com 2.215.000 habitantes, conta com, aproximadamente, 1.300 pessoas em situação de rua. O padre Takea Motoi, missionário da Congregação do Verbo Divino é um dos fundadores do projeto Sasashima Kyousei-kai. Ele explica que Sasashima é o nome do bairro e a palavra Kyousei-kai significa “viver juntos”. O projeto consiste em defender os direitos dos moradores de rua, resgatálos das ruas e dar suporte para a sua inserção social.   Sopa na rua Ao lado da catedral de Nagoya, um grupo voluntário de 10 pessoas prepara a sopa, que tem apoio da Second Harvest Nagoya, uma espécie de Banco de Alimentos que os recolhe e redistribui às organizações sociais. Às 18h30, três carros deixam o local. Os termômetros marcam cinco graus. Representantes da ONG chegam e se instalam no local e, em poucos minutos, um grupo assiste aos vídeos ali disponíveis. Outro entra na fi la para um jogo de sorte que oferece uma barra de chocolate ao vencedor. Em outra barraca, as pessoas cantam “karaokê”. Num outro canto, profissionais da saúde atendem aos doentes. Após duas horas de convivência, o jantar é servido com os tradicionais “hashis” (palitinhos japoneses).   Realidade da rua Edílson Shinozaki, nissei conhecido por Dinho, nascido no bairro da Liberdade em São Paulo e há 10 anos no Japão, foi nosso guia. Ele nos explica que “a maioria das pessoas em situação de rua em Nagoya são homens com mais de 50 anos e cerca de 20% têm menos de 50 anos. Não há informações sobre crianças e adolescentes. Uma boa parte tem família em situação econômica razoável. Apesar disso, não recorrem a ela. Eles são ignorados pela maior parte da sociedade e pelos órgãos públicos”. Para Takea Motoi, a razão da existência dos moradores de rua é econômica: “A sociedade japonesa precisa de gente nestas condições para manter em funcionamento a sua estrutura econômica. Os contratos de trabalho são muito vulneráveis. Entre eles estão os de mulheres que fogem da violência doméstica e de pessoas com deficiências”, acrescenta. Talvez por isso, Matsumoto os defina como “refugiados econômicos”. Em nossa visita pelo centro de Nagoya, uma senhora que não quis se identificar, nos explicou que ela e o esposo são líderes de um movimento organizado e coordenado pelas pessoas em situação de rua em defesa dos seus direitos. “Foi o único modo de sermos atendidos e estabelecer um canal de diálogo com as autoridades”, ressaltou a senhora. A matéria completa pode ser encontrada no site da Rede Rua ( www.rederua.com.br ). No próximo número, publicaremos uma entrevista com o senhor Matsumoto Hiroshi.    Edição N° 196 - Abril de 2011

  • Memória e indignação

    Um ano após a execução de seis pessoas embaixo do Viaduto Jaçanã, próximo à Praça Santos Dumont, em Guarulhos, o crime é, ainda, um grande mistério. O processo continua com o Delegado de Polícia do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) para juntar provas. Dra. Michael Nolan, advogada e conselheira do Condepe que acompanha os processos do Massacre de 2004, das seis mortes do Jaçanã e das mortes dos catadores de material reciclável do Brás, afirmou que já se sabe quem são os autores do crime do Jaçanã, mas ainda faltam provas. “O inquérito que investiga a morte dos seis, infelizmente é, apenas, um inquérito porque ainda faltam provas”, afirmou ela. Ainda segundo a advogada, estão aguardando a resposta das empresas telefônicas porque foi pedido a quebra de sigilo telefônico das pessoas suspeitas. Para a Dra. Michael, é importante que quem saiba algo colabore com a investigação. “As pessoas não precisam se identificar é só nos procurar por meio deste jornal”, lembrou Michael. Para fazer memória e cobrar uma solução dessa barbárie e dos outros massacres, várias organizações sociais, como o Fórum Permanente de Acompanhamento de Políticas Públicas de São Paulo, a Prefeitura de Guarulhos, a Associação São Geraldo, a Conferência dos Religiosos de São Paulo, a Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de São Paulo e outras reuniram-se no local do massacre. “Vamos iniciar este momento que é de oração, é de memória, é de indignação porque há um ano estávamos aqui também para protestar contra a morte dos seis companheiros que foram executados aqui”, lembrou padre Júlio Lancellotti.   Depoimentos  “Algumas fotografias mostram que alguns ainda estavam dormindo e não tiveram nenhuma possibilidade de se defender. O que torna esse massacre do Jaçanã um grande ato de covardia, de vingança e de extermínio”, lembra padre Júlio. Para René, coordenador do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, afirmou que “cabe a nós tomar uma atitude, dar um basta e criar uma consciência que esta situação não pode acontecer mais”. Já para irmã Alberta Girardi, Fotos: Alderon Costa/Rede Rua da Comissão Pastoral da Terra de São Paulo, o problema é social. “Tem tanta gente que pensa que a pessoa em situação de rua é vagabunda e não pensa que ela é vítima do progresso, do qual não consegue acompanhar”, declarou irmã Alberta. Para Maria Nazareth Cupertino, membro do Fórum de Assistência Social e coordenadora do Centro de Acolhida Pousada da Esperança, em Santo Amaro, denunciou a violência da Polícia Militar com as pessoas em situação de rua. ”Há umas três semanas atrás a polícia bateu numa pessoa com deficiência mental na frente do albergue”, declarou ela. Foi feito boletim de ocorrência e estão aguardando o relatório de corpo de delito, segundo Nazareth. Ao final do ato, Eduardo Ferreira de Paulo, representante da Comissão Nacional do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), lembrou que a violência tem suas raízes também na falta de políticas públicas. “Isto acontece porque faltam projetos e políticas públicas e que a apuração seja feita com rigor, pois isto é um absurdo e não pode virar moda e ficar impune matar moradores de rua e catadores de material reciclável”, declarou Ferreira. Durante a celebração, foram colocadas velas e todos que foram executados em Guarulhos foram lembrados: Manoel do Nascimento Batista Cerqueira Junior, Reinaldo Rodrigues Ananias, Leandro Jesus de Oliveira, Adriano de Jesus, Daniel Barbosa de Oliveira, Vítima não identificada: cor parda, 1,70m, 25 a 30 anos. Edição N° 197 - Maio de 2011

  • Do outro lado, um povo sem paz

    Parte II – Um testemunho de vida Matsumoto Hiroshi, da Associação Sasashima Kyousei-kai é uma das pessoas admiráveis de Nagoya. Nascido em 1947, período em que o Japão vivia na pobreza do pós-guerra. Em razão de tuberculose sofrida pela mãe ele foi internado, durante seis anos, no Lar Santa Elizabeth, instituição que acolhia crianças abandonadas que nasceram da relação de soldados americanos com japonesas durante a guerra. Quando iniciou a Guerra do Vietnã, em 1969, ele entrou na universidade em Tokyo. Nessa época, um amigo alistou-se no exército americano, foi para o Vietnã e morreu. Este acontecimento, as experiências do pósguerra e o orfanato o fizeram pensar em paz. A experiência de ser filho de um pastor anglicano o fez deixar a universidade, tornar- se religioso e trabalhar em prol da paz. “Paz e guerra são antônimos, mas não é a este tipo de paz que me refiro. Os pobres não vivem uma situação de guerra, mas vivem constantemente a não paz”, explica. Por carência de vocações, a sua congregação faliu e ele decidiu se mudar para Nagoya em 1975. Causou-lhe um grande impacto saber pelos jornais que onze moradores de rua haviam morrido naquele ano devido à fome e ao frio. Este episódio fez com que se juntasse a outras pessoas e criassem a ONG Sasashima Kyosei-kai. Matsumoto faz uma distinção entre sem casa e sem lar. “Muitos brasileiros vieram ao Japão, deram lucro às fábricas e ficaram desempregados. Eles não perderam a moradia, mas não tinham o que comer. Tinham casa, mas não tinham lar. Ainda que percam suas casas se voltarem ao Brasil provavelmente encontrem um lar, mas os japoneses que enfrentaram esta mesma crise perderam tudo e não têm para onde ir. Alguns têm até família, mas sofrem impedimentos para esse retorno ao lar”. Matsumoto mostra a arquitetura de pedras que pode ser vista sob os viadutos para impedir que as pessoas de rua durmam nesses locais. Na luta pela garantia do direito do morador de rua se instalar em locais públicos da cidade, ele e dois companheiros foram presos pela polícia. Em seguida, algumas idéias de Matsumoto Hiroshi sobre a realidade de rua em Nagoya.   As causas da situação de rua no Japão “O morador de rua japonês é consequência da modernidade. A sociedade é egoísta, consumista e fechada em si mesma. Estamos perdendo os valores familiares. Ele é vítima da pro- dução em massa, da busca por mão de obra barata e imediata. São usados e depois descartados. São refugiados econômicos. Os políticos defendem que se a pessoa batalhar consegue o mínimo para sobreviver e alcança a felicidade sozinha. A escola ensina que se você se esforçar e estudar bastante você consegue. A responsabilidade e só da criança, só da pessoa. Não há uma responsabilidade coletiva. Muitos, quando adultos, ao verem que não conseguiram se responsabilizar por si, consideram-se vítimas de si mesmo e não da sociedade. Este grande sofrimento joga muitas pessoas nas ruas”.   Oferecer um ambiente familiar “A cultura tradicional nos apresenta a imagem do samurai com o palito de dente na boca como se tivesse acabado de comer uma refeição. Mesmo que ele esteja morrendo de fome ele tem que manter a aparência de que está bem. Ainda que a família dele esteja passando fome ele não pode demonstrar fraqueza. Outro aspecto é a ligação da pessoa com o vilarejo de onde saiu. Se sair do vilarejo para outra cidade em busca de trabalho e fracassar ela não consegue voltar por vergonha. Os vizinhos poderiam dizer que ele não deu certo, que é imprestável. Essa mentalidade faz com que muitos se suicidem. O nosso desafio é trabalhar para que nos tornemos a família desses moradores de rua, oferecer um ambiente familiar para que ele possa se levantar e andar de novo e saiba que contará sempre com apoio para vencer”.   O morador de rua prima pela solidariedade “Eles são muito solidários, preocupados uns com os outros. A sociedade japonesa vive essa disputa de quem tem mais, quem chega mais rápido ao topo. Nessa sociedade, o morador de rua prima pela solidariedade, pelo lado bom. Eles podem não ter a capacidade intelectual dos que ganham dinheiro, mas possuem uma capacidade enorme de se ajudar, de cuidar um do outro”.   Edição N° 197 - Maio de 2011

  • 10 anos do Movimento dos Catadores

    Sabemos que o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) é importante para a nossa organização social, pois antes do MNCR, nós catadores(as), não passávamos de verdadeiras marionetes nas mãos de políticos profissionais, ongueiros, governantes e dos patrões do lixo. Tivemos vários momentos em que estávamos sendo explorados, enganados e sequer, podíamos ver isso. Apenas sentir, aceitar e calar. Vamos relembrar um pouco, onde cada um de nós estava há 10 anos atrás? A maioria de nós vivíamos em lixões, sem condições dignas de trabalho e sujeitos a todos os riscos impostos pela situação de exploração da nossa categoria. Nessa época nem se ousava pensar que os catadores(as) eram uma categoria. Até meados do ano 2000, nossa tarefa na cadeia produtiva era simplesmente catar. Se perguntávamos para qualquer companheiro, “você gosta de ser catador”? Entre as várias respostas, o que se constatava era que a maioria de nós estávamos catando por falta de oportunidade de trabalho, marginalizados pelo mercado formal de trabalho em que poucos têm tudo e muitos quase nada, vindos do interior, negros, brancos, mulheres, crianças, idosos, analfabetos ou com pouca escolaridade, concentrados nas grandes metrópoles do País. Foi em 2001, que conseguimos dar vida, cara, cor e rosto a nossa organização, o MNCR, cujo nascimento foi cheio de problemas e poucas pessoas para resolvê-los. Desde o início, os princípios de protagonismo de classe com a autogestão/organização nos uniram, pois os grandes desafi os éramos nós, os catadores, que deveríamos encarar com o próprio sangue, suor e força de vontade. Com o passar do tempo e com nossas ações a todo vapor, vimos que vários grupos da sociedade, que antes da existência do MNCR nos viravam as costas, hoje, das formas mais inimagináveis possíveis, nos assediam para colocarem suas logomarcas e seus patrocínios. A maioria de nós não acreditava que chegaríamos até aqui, mais fortes, maiores, mais organizados. É sempre assim, a gente é desse jeito, não acreditamos no novo, apoiamos e desconfi amos ao mesmo tempo, somos brasileiros por excelência. Precisávamos disso, pois as difi culdades que estavam expostas aos nossos olhos apontavam para a formação de um movimento social, combativo e solidário, criando a independência dos catadores em relação aos ferros-velhos, a governos e fortalecendo a autogestão dos catadores. Foram muitas lutas, muitas ruas tomadas, muitas prefeituras ocupadas, muitas portas fechadas que tivemos que abrir. Tudo o que conquistamos foi por meio da luta e da solidariedade. Somos povo e nos realizamos com outros movimentos desse mesmo povo. São os princípios que norteiam a nossa organização. Chegamos a ser presos, fomos perseguidos, já tentaram nos comprar, mesmo com todas as condições adversas, nos mantivemos firmes em nosso propósito de justiça e de liberdade. Isso tudo só faz fortalecer cada vez mais nossa luta. Éramos chamados de lixeiros, hoje gerimos empreendimentos autogestionários, conquistamos políticas públicas de inclusão e de valorização de nossa categoria. No entanto, muitos oportunistas procuram não reconhecer o movimento, mas querem se beneficiar das conquistas forjadas no suor do dia a dia dos nossos companheiros. Permanecer e durar no tempo é o que vai garantir nossa vitória sobre todas essas condições injustas impostas pelos inimigos que ganham e se promovem em cima da miséria alheia. Ainda temos muitos desafios pela frente. Vida longa ao MNCR! Viva os dez anos! Porque quem tem medo da luta não nasce! Que venham mais dez, vinte, trinta anos! Viva os catadores e as catadoras do mundo! Edição N° 198 - Junho de 2011

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